quarta-feira, 16 de junho de 2010

PROCESSOS



Atrás de cada processo tem um ser humano.

Anotou? Na busca de Justiça o cidadão comum utiliza de uma coisa chamada processo para atingir seus escopos, traduzindo, é como uma pessoa que pega um ônibus para chegar no lugar que quer ir. Acontece que, como o ônibus, há os obstáculos, é o ônibus que não pára, ruas esburacadas, trechos interditados, terminais de integração, quebra do ônibus, pneus furados, assaltos, parada para tomar café quando o motorista é irresponsável, para o trocador urinar ou namorar, se o mesmo acontece com ele e por aí vai.

O motorista não está ligando se o cidadão marcou, por exemplo, um exame com antecedência de 6 (seis) meses e tem que chegar na hora marcada. Não está nem aí, não pensa no passageiro, o seu objetivo é fazer corridas, chegar no horário, não ser assaltado e nem pagar pelos prejuízos que acontecem no ônibus.

Vamos ao processo.

O cidadão quer Justiça, quer, por exemplo, que a Associação de Promotores de Festa deixem de fazer barulho. A lei diz que eles só podem fazer festa se houver revestimento acústico, com alvará para funcionar, terminando meia noite ou duas da manhã, conforme a época, não podem vender bebidas a menores, não podem consumir drogas e por aí vai.

Ingressa na Justiça com Ação de Obrigação de Fazer cominada com Ação de Danos e pedido de Liminar. De cara logo, tem que pagar custas ou se alega que pobre, há de haver alguém – o próprio Juiz – que pedirá comprovação do fato. Primeira parada.

Recebida a Ação, vamos andar. A distribuição passa dois dias para mandar para o cartório. O cartório, formada por gente nova que não conhece o roteiro do ônibus, passa cinco dias, no mínimo, para “subir” com o processo. Ou, se está em correição, vamos passar 35 dias para o fato. Segunda parada.

O processo “sobe”. Se tem Juiz, titular, a gente fica esperando a boa vontade de vossa excelência. Se tem Juiz, substituto, só despacha “coisas urgentes” e que “não fira, não gere polêmica, não passe por cima de”, enfim, não faz nada. Se não tem Juiz, aguarde-se. Mais uma parada, 6 meses do mínimo.

Um exemplo: tenho processos de 2001 esperando despacho ou sentença do Juiz.

Continuemos, se o Juiz está esperando ser Desembargador, espere 5 anos ou ingresse com outra Ação, esperando que o computador erra na distribuição e cais em outra vara. Pegue outro ônibus. Aí, o Juiz manda, quase sempre, ouvir o Ministério Público, o Promotor, que dá seu parecer. Se o Promotor tiver de férias ou recesso, espere 6 meses.

Voltando do Promotor, mais 6 meses para o Juiz despachar, se não estiver fazendo curso, se não estiver de férias, se não estiver de recesso, se não estiver acumulando varas, se não estiver na corregedoria, se não estiver no chamado eleitoral. Enfim, aguarde.

Deu a sentença, eureca! Aí vem as apelações, agravos, recursos, e por aí vai até o cidadão que queria Justiça, morre. Morre esperando o ônibus.

É preciso que, pelo menos, o trocador funcione; que, pelo menos, seja ágil o protocolo do Judiciário, que a Distribuição corra, que a Secretária Judicial cumpra os prazos e remeta ao Juiz, que o Juiz obedeça os 10 dias para o despacho, que o Promotor ature somente nos processos que seja obrigatório, que o Oficial de Justiça apareça no trabalho e cumpra os mandados, enfim, é preciso pensar que atrás de cada processo existe uma pessoa humana esperando ser atendida.

É difícil para o profissional que se preza viver o dia-a-dia do cidadão indefeso, à mercê de um monte de motoristas irresponsáveis, de integrantes do Judiciário que vivem em outro mundo e pensam que processos são pedaços de papel e que as pessoas que procuram o Judiciário vão ali para “encher o saco”.

Que nunca precisem do Judiciário Maranhense.

Que nunca andem de ônibus, continuem nos carros oficiais pagos pelo povo.
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Artigo publicado, reproduzido na íntegra, Jornal EXTRA, edição semanal de 29/01 a 04 de fevereiro de 2007. Colocado no blog por oportuno diante da morosidade dos processos nas Varas e Juizados Especiais. Sem nominar para ser Ético.

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